sábado, 14 de dezembro de 2013

Texto de Leonardo Santos Garcia sobre a edição 2013 do Salão de Artes de MS, apresentada no Museu de Arte Contemporânea de MS de novembro de 2013 a janeiro de 2014.

Evandro Prado, aquarela, 2013



A exposição do Salão de Arte de Mato Grosso do Sul 2013, apresentada no Museu de Arte Contemporânea de MS (MARCO), coloca em xeque a existência e representatividade da arte.

O que é arte, o que é a Arte?

Quem ou o que legitima algo como arte?
Isso é arte?

O museu está saturado! Fujam para as montanhas! Foi isso que eu senti quando passei por lá. Infelizmente.

Contudo, todo o caos “artístico” ali abrigado me faz refletir e pensar nas indagações feitas acima. Nem tudo que está lá é ruim, falarei dos bons frutos mais a frente.

Começo com algumas considerações sobre a obra da artista Priscilla Pessoa intitulada “2113”. 

Confesso que sou um apreciador de instalações e intervenções artísticas e a sala negra do Marco me arrepia artisticamente, porém a intervenção da artista não me causou nada. Esqueletos humanos em giz escolar branco estampam uma parede da sala, não posso descartar a qualidade estética dos desenhos e as insinuações de perspectivas muito bem resolvidas, mas para mim a obra é vaga! 

Falta algo, nem mesmo a proposta de intervenção do público consegue preencher esse vazio, ou pensando de outro modo, essa proposta tenha deixado a obra vulnerável, pois o que foi desenhado ali pelos visitantes não era o que representava a expectativa da artista. A obra não convence, é fraca como os ossos secos dos esqueletos, é frágil como o giz ali usado. Eu tive a ousadia de atribuir outro título à obra: “A morte da Arte”. Desculpe-me o trocadilho.

Mais uma vez Evandro Prado aparece com sua temática crítico-religioso, eu já nem diria que é crítico mais. “Sede Vacante I, II e III”. Mais do mesmo, de novo. Já escrevi sobre obras do Evandro quando expôs na sala negra nesse mesmo ano, gostei. Mas isso de novo, não! Não é original, não causa nada, não é de efeito, não funciona. Evandro, o Papa EMÉRITO Bento XVI já pediu as contas, já se foi, deixe-o em paz e, por favor, não vá atrás do outro.

Um artista precisa se renovar, buscar novas indagações, promover sua criatividade, caminhar em frente. São eles que carregam a arte, se estagnarem a arte pesará sobre seus ombros e os matará sufocantemente. Artistas, não se matem, muito menos a arte!

Quero falar agora do que vi de bom, é mais produtivo. Destaco as fotografias de Marcos Muniz intituladas “Baque Sagrado ou Travessia do Tambor”. São belas imagens, fortes, a cultura popular é escancarada ali. As fotografias tem um “quê” de Sebastião Salgado o que é algo muito bom. A linguagem da Fotografia, a meu ver, pode ser um tanto quanto difícil de ser engolida enquanto arte se pensarmos hoje nas tecnologias digitais de manipulação de imagens e vídeos e todos os recursos da fotografia digital que a deixa um pouco distante das outras linguagens como a pintura e o desenho. 

Mas isso já vem sendo modelado há um tempo graças à grandes fotógrafos que retratavam a realidade e a imaginação através de suas lentes conduzidas pelo seu olhar.

As fotografias de Marco Muniz tem uma coloração marrom acinzentado que me trás a veracidade do berço das culturas populares na vida simples, muitas vezes à beira da pobreza. Os olhos ali retratados são vivos, pulsantes, mais curiosos do que os de quem as olham, as marcas das mãos mostram a força do homem simples, do homem de fé, do homem que produz a bela cultura ali demonstrada. Lindas fotografias, sou capaz de ouvir a música que sai da sanfona e da viola, tá ouvindo?

Os vídeos de Chico Santos prenderam minha atenção. Os vídeos arte são recursos muito utilizados na arte contemporânea e vêm ganhando espaço nos museus como representatividade artística. Basicamente, intitulados de “Invasão” eles são capazes de invadir, me invadiram. Os vídeos mostram uma sequência de imagens repetidas de minúsculas peças em formato de casas e prédios invadindo diferentes espaços. É uma obra minimalista. Beira a um alerta espaço ambiental da nossa sociedade. 

É a arte enxergando um problema social. É um retrato minimalista de um grande problema. Eu gostei. É ironicamente engraçado.

Por último quero citar a obra de Leandra Espírito Santo. “Em busca da Terra do Nunca” é leve e descontraída. Uma pequena casa flutua pendurada por balões em busca da Terra do Nunca. São fotografias, porém é possível perceber mentalmente o movimento do voo da casa pela paisagem. Sinto até a brisa que a leva para longe. Eu achei visualmente interessante pela condição do flutuar. 

Olhando para as obras fiquei me perguntando: Será que essa casa pousou onde queria? Encontrou o que procurava? Quem mora lá dentro? Eu? Você? A Arte?

Pense aí.


Leonardo Santos Garcia é acadêmico do curso de Artes Visuais da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. O texto foi produzido como trabalho da disciplina Fundamentos da Linguagem Visual, ministrada pelo professor Rafael Maldonado.

 

Texto de Nathaly G. Tenório sobre a exposição Admirável Mundo Novo, de Lula Ricardi, apresentada no Museu de Arte Contemporânea de MS de agosto a outubro de 2013.

Lula Ricardi, fotografia, 2013


   O quão filhos do sistema nós somos? Lula Ricardi nos joga essa questão como quem joga um lenço á brisa, esperando que o mesmo vá, porém nunca se perca.  Nesta temporada, em exibição no MARCO, se encontra  a exposição de Lula, denominada: ‘’ Admirável Mundo Novo’’.
     O artista define sua obra como ‘futurista e desumanizada’, de modo que se pareça com os dias atuais. Composta por cabeças de bonecas em diversas situações é possível observar tal sentido enquanto absorvemos o contexto que nós mesmos construímos, padronizado e inundado de regras.
     A visão de sociedade que temos é manipulada. Mas evitamos perceber isso, pois nos é confortável conviver em uma determinada harmonia regrada, pautada numa segurança invisível que nos consome, enquanto definhamos. Lula usou bonecas para suas obras, o que em minha concepção, é uma metáfora que se remete justamente á nossa semelhança enquanto humanos, nossa semelhança enquanto componentes do sistema. 
    Quando enfileira as cabeças de bonecas e as suspende por linhas, está apontando para a capacidade de sucumbir, a capacidade de engolir o que nos é dado, sem ao menos mastigar. Em outro momento, e dessa vez trabalhando com fotografia, Lula espeta as cabeças num cenário de açougue, demonstrando que estamos propensos ao que nos é dado, que somos tão inclinados ao comum que mesmo em uma situação degradante, optamos sempre em aceitar a condição.
     Fazendo alusão ás técnicas que foram utilizadas pelo artista, tenho em vista que foram bem elaboradas, e que fazem um encaixe interessante com a obra. Desde imagens manipuladas no computador, que usando simples efeitos conferiram uma poética autônoma á obra, até a aplicação de pedaços de cabeças de bonecas em uma estante, para que seja observada com atenção.
     O tema é comum, porém trabalhado de um jeito inerente á expectativa, nos ajuda á conferir para Lula um atributo de artista, afinal, fazer arte é também distorcer o contexto sutilmente (ou não) para que se perceba a metáfora íntima do que em geral, deixa-se passar batido.



Nathaly G. Tenório é acadêmica do curso de Artes Visuais da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. O texto foi produzido como trabalho da disciplina Fundamentos da Linguagem Visual, ministrada pelo professor Rafael Maldonado.
 

Texto de Amanda Mamede sobre a exposição Exposição Admirável Mundo Novo, de Lula Ricardi, apresentada no Museu de Arte Contemporânea de MS no segundo semestre de 2013

detalhe da instalação de Lula Ricardi, exposta no MARCO em 2013



A mostra Admirável Mundo Novo, do artista gráfico e fotógrafo Lula Ricardi, em exposição no Museu de Arte Contemporânea de MS me chamou atenção exatamente devido aos paralelos que foram sendo realizados, automaticamente, com a obra homônima, de Aldous Huxley. Admirável Mundo Novo é um livro de 1931, onde, já no século passado, o autor pressentiu o que iria ocorrer com os padrões da sociedade do futuro.
No livro, é detalhado o funcionamento de uma sociedade divida em castas, onde todas as pessoas são criadas em laboratório e condicionadas a pertencer à determinada classe. Essas pessoas “aceitam” sua forma de vida e são pressionadas a se sentirem felizes com isso, através do inicial condicionamento no laboratório no momento de sua criação e ao contínuo fornecimento de um tipo de droga pelo governo, a qual constantemente reforçava a ideia de uma vida feliz e natural.
Logo na entrada da sala de exposições, nos deparamos com centenas de cabeças de bonecas penduradas por fios caindo do teto, algo que nos transmitia uma ideia de massificação, perda de um equilíbrio humanista, desvalorização da condição humana, mais especificamente. Assunto que se faz presente no livro em que a mostra foi inspirada. Nessa linha de pensamento, ainda vemos uma fotografia de várias dessas cabeças de bonecas alinhadas em espetos dentro de um forno elétrico, como uma carne disponível à venda. Corpos produzidos em massa (como os dos laboratórios no livro), jogados ao consumo do restante da sociedade.
            Outros modos de expressar a desvalorização dos valores naturais e humanistas – fotografias de cabeças de bonecas jogadas ao chão, amassadas, quebradas, destruídas. Uma instalação com as mesmas cabeças de bonecas penduradas dentro de um suporte, juntamente com pedaços de carne, mostra a contradição dessa massificação, do sentido da vida e do rumo que ela toma, ou como é vivida, uma vez que todos, na morte, tornam-se idênticos, sem distinção das classes, ideologias, cor, raça. Nos tornamos apenas matéria decomposta, como o artista se refere. Pedacinhos quebrados dessas bonecas dentro de uma gaveta abaixo das cabeças inteiras e dos pedaços de carne mostram a completa homogeneidade do estado encontrado no desconhecido da morte.
            Um conjunto de quadros alinhados e próximos, com rostos estilizados e, de alguma forma com olhos tampados, me remete às divisões das classes. Por que a forma de todos os rostos é idêntica, porém, os elementos acrescidos em cada um são completamente diferentes, por exemplo, cabelos, chapéus, óculos, plano em que estão posicionados etc.
            Constituída de quatorze fotografias, vinte e seis gravuras e três instalações, a obra de Ricardi, como o próprio mencionou, busca abstrair a realidade da sociedade massificada e padronizada, criar uma ponte abstrata do que Huxley retratou, no século passado, e o que está ocorrendo no momento, na atual sociedade.

 

Amanda Mamede é acadêmica do curso de Artes Visuais da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. O texto foi produzido como trabalho da disciplina Fundamentos da Linguagem Visual, ministrada pelo professor Rafael Maldonado.