segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Texto de Maria Helena Brancher sobre a exposição de Esther Casanova, apresentada no Museu de Arte Contemporânea de MS de abril a junho de 2013

Esther Casanova, Trajetos Urbanos V, 2011,  colagens, 24x32 cm, bloco com 20 obras


Uma cronologia pessoal: Trajetos de Esther Casanova

Natural da Capital paulista, onde reside e trabalha, a artista plástica Esther Casanova foi uma dos quatro artistas participantes da Primeira Temporada de Exposições 2013, do MARCO - Museu de Arte Contemporânea de Mato Grosso do Sul.  Ao todo, são 48 obras expostas em diferentes tamanhos e molduras que apresentam uma proposta – Trajetos - em que dá vida ao espaço urbano constituído e mesclado de realidades, sonhos e memórias. “A produção da artista pode ser considerada intelectual e pictória, despojada de convencionalismos, como uma profunda saudação à vida”, diz o crítico de artes Andrés Hernandez.

Uma vida revivida, eu diria, através de percursos cromáticos que deslizam desejos. Esses desejos são representados pela reconstituição de parte de caminhos já percorridos em diferentes cidades e países, através da utilização da fotografia captada durante seus percursos diários. A cada passo, uma nova cena, uma imagem surge e vai se sobrepondo a outra, sucessivamente, adquirindo movimento, gerando camadas assim como os processos da pintura e colagens, das quais se utiliza. Estas se justapõem (imagens e suporte) numa composição plástica. As fotos, desenhos, imagens de circulação em massa, colhidas no transcurso de suas andanças, são elementos valorizados pela artista. Composição que resulta num belo cromatismo.

As formas representadas em espaço pictórios são ricas em planos e seqüencias, linhas e contornos que estruturam a materialidade visual das obras da artista, diversificando os ângulos de visão e contemplação do espectador. As linhas aparecem aqui como contorno e geometria dos prédios que ela representa em cada tela, como um registro cartográfico.

Em algumas seqüencias, aparecem os contornos dos prédios, dos espaços que os compõem; mas, em outras, a difusão cromática se expande, de forma a não deixar a definição espacial aparente.
Podemos dizer, então, que a intensidade cromática se dilui na composição para deixar em realce a coloração da fronteira na composição, provocando contrapontos espaciais entre os elementos representados e o espaço pictórico, sem alteração no seu formato original. Esta diferença nas tonalidades em cada peça nos remete a aspectos subjetivos do eu e do outro.

A luz se converte num elemento básico na linguagem plástica da artista, estabelecendo nexos nos contrastes com as sombras, definindo conexões entre claros e escuros, e equilíbrio/desequilíbrio ao que é material, palpável, visível e cromático. A dinâmica espacial que os trabalhos nos oferecem se traduz no deslocamento pictórico e na criação de planos que se diluem e fundem de tal forma que hibridizam e contextualizam a composição simultaneamente a partir de materialidade e estética complexas e coerentes. Contrapontos de circularidade e linearidade de parâmetros estéticos e plásticos configuram e definem os seus trabalhos.

O resultado, como disse o crítico de arte Andrés Hernandez no folder de apresentação, “é uma mudança radical nas referências literais dos seres humanos; é o desafio de transformar, dar um novo significado ao original”.  E, como a própria artista define o seu trabalho: “é desafiar para ter sentido”.

 O aspecto relevante a ser considerado aqui é que, por meio de ordenações, se objetiva o conteúdo. A forma converte a expressão subjetiva em comunicação subjetiva. Por isso, segundo Faya Ostrower, “o formar, o criar, é sempre um ordenar e comunicar. Não fosse assim não haveria diálogo”. E, ao homem é possível essa ligação do ontem e do amanhã. Pode atravessar o presente, pode compreender o instante atual como extensão mais recente de um passado, que ao tocar no futuro novamente recua e já se torna passado. Dessa seqüencia viva ele pode reter certas passagens e pode guardá-las, para um futuro ignorado e imprevisível. Para o mundo da arte.

Se a arte é o veículo de uma percepção especial de mundo, o artista é o agente que mais tem condições de elaborá-lo. “Para a concretização de seu objetivo, não basta realizar a obra, deve transmiti-la ao observador da forma mais simples, mais clara, mais sóbria possível”, segundo Karl Popper. Então, concluo: assim é a arte de Esther Casanova.

Maria Helena Brancher é acadêmica do curso de Artes Visuais da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. O texto foi produzido como trabalho da disciplina Fundamentos da Linguagem Visual, ministrada pelo professor Rafael Maldonado.