segunda-feira, 22 de julho de 2013

Geometrias, série de gravuras de William Menkes

William Menkes, sem título, 2013, água forte, 20 x 30 cm.


O mosaico visual expresso em diferentes formas no cotidiano urbano sempre serve como pretexto para inúmeras inquietações e propostas artísticas. Formas, cores, texturas são elementos que reforçam a função e a presença estética das coisas dispostas nos espaços das cidades.

 
Dar novos sentidos e significados para o que nos cerca é exercício constante do ato criativo. Arte espelha a cidade, espelha o outro. Arte espelha desejos. E o desejo de somar ou subtrair valores para o que se encontra estabelecido provoca no artista criador a necessidade de rever e reinterpretar sutilmente o mundo.

 
Os trabalhos dessa exposição surgiram do interesse de buscar em determinado objeto trivial uma potência estética para transformá-lo em assunto de arte. Assim, William Menkes se apropriou do desenho geométrico das estruturas de torres metálicas espalhadas na cidade para elaborar suas dinâmicas rítmicas usando os recursos de linguagem da gravura em metal, explorando e variando o espaço perspectivo no posicionamento do olhar de baixo para o topo dessas torres.

 
A série Geometrias exemplifica no seu desenvolvimento a capacidade de se perceber nas coisas banais um valor não evidenciado, narrativa não mencionada, importância não estabelecida. Trata-se de um conjunto de gravuras que representa fragmentos desse elemento de avanço tecnológico da engenharia – torres para telecomunicação - cuja presença, numa interpretação poetizada, esboça desenhos geométricos em suspensão no céu.

 
Ideia que foi o ponto de partida para William Menkes. A elaboração das gravuras se origina da observação do desenho dessas estruturas. Assim, as composições experienciadas resultam do cruzamento vertical, horizontal e diagonal de linhas suaves e densas, em movimentos visuais que aproximam e afastam planos, definem profundidade e extrapolam os limites da imagem se projetando entre as tramas do papel.

 
Um motivo aparentemente simples desenvolvido com rigor e competência. Essa primeira mostra individual sinaliza um bom início de percurso de produção artística de William Menkes, uma das oportunidades que certamente contribuirão no refinamento e na mobilidade de seu pensamento criativo.

 
 
Rafael Maldonado
julho de 2013

Texto de Leonardo Santos Garcia sobre a exposição Dominus Tecum, de Evandro Prado, apresentada no Museu de Arte Contemporânea de MS de abril a junho de 2013

Instalação de Evandro Prado, no Museu de Arte Contemporânea de MS

A arte contemporânea como atual fase artística em pleno desenvolvimento encontra algumas barreiras notáveis que impedem uma compreensão e até mesmo uma aceitação por grande parte da sociedade. Identificada pelo seu panorama de múltiplas expressões com esculturas, pinturas, vídeos, objetos de arte e o carro chefe: as instalações que as visualizo como uma arte efêmera em que se pode construir e desfazer simplesmente. Particularmente, sou enamorado por instalações. São vivas, gritantes, perturbam e encantam.
 
Em sua exposição Dominus Tecum, Evandro Prado encara e aproveita toda a perspicácia da arte contemporânea e junto dela integra uma “aliada” poderosa: a religião. Em um atual momento histórico, nada menos oportuno, a renúncia do líder da Igreja Católica traz a esse artista sua poética de trabalho para as obras.
Sobre minha análise, tenho uma visão geral da disposição das obras na sala, que a meu ver significa que a exposição segue uma linearidade. Insinuações acontecem ao longo do corredor que nos leva ao grand finale na sala seguinte. Vamos parte a parte.
A primeira obra Dominus Tecum (em tradução O Senhor seja convosco, por sinal um nome muito sugestivo), um lampadário feito com justaposição de imagens de santos está de cabeça para baixo e com um pequeno grande detalhe: o líder que está no “topo” não tem cabeça. Isso logo me incita que algo de errado aconteceu. Está fora da doutrina. Esse objeto deixou-me intrigado e curioso para o que viria em seguida.
Missões então aparece, o vídeo feito de dois fragmentos que foram somados de maneira que a passagem sempre fosse a mesma e repetitiva (e que tem um significado pra isso), mostra uma escultura, que para mim é de um anjo, segurando um lençol que seria a representação do Santo Sudário de Cristo com um coração bordado. O significado dessa obra é claro, a Missão da Igreja e de seu líder é disseminar o evangelho, pregar, repetitivamente mesmo com toda a conturbação retratada na peça anterior. A repetição apresentada no vídeo é conturbadora, angustiante.
Ruína. O nome dessa obra antecipa a representação da instalação subsequente. Uma grande imagem de um altar de uma igreja vazia. Em frente ao altar um corpo. O Cristo. Abandonado. Nú. Uma imagem irônica, triste. A igreja foi abandonada pelo seu líder, ele a deixou e não cumpre mais a Missão. Um retrato escuro, frio, silencioso, pesado, meio fúnebre.
El Grand Finale. Prado chega à conclusão de sua obra utilizando a chave mestra da arte contemporânea: a instalação. Constuindo Paraísos, uma grande cruz latina desenhada com tijolinhos, o chão da sala é coberto com os tijolos formando um desenho negativo da nave central de uma igreja. O objetivo é demonstrar uma não-construção, mas a minha leitura é de uma destruição do paraíso mesmo. Todas as nuances apresentadas nas obras anteriores nos leva as ruínas da igreja. A sensação de andar sobre os tijolos e ouvir o farfalhar do atrito entre eles é arrepiador, caminho sobre uma grande ruína. E como trunfo, não menos importante, Sede Vacante (em tradução Sé Vazia) uma escultura de Joseph Ratzinger em gesso toda branca. A cabeça que faltava do ser no topo do lampadário emerge da parede negra esboçando uma face com ares debochados, um sorriso contido irônico. O busto olha a desconstrução de sua igreja e ele em posição de troféu de caça não parece demonstrar reação insatisfatória com seu feito que provocou toda a desgraça.
Evandro Prado utilizou com maestria os elementos e fatos históricos para sua proposta de arte. Fez com que o espectador entrasse na obra, caminhasse sobre a arte. Expôs a fragilidade humana e a infalibilidade de um líder religioso visto como santo pelos fiéis seguidores da Santa Igreja Católica. Desconstruiu uma doutrina e nos propôs um novo paradigma, um novo olhar. Por fim, Dominus Tecum, Amen.
Leonardo Santos Garcia é acadêmico do curso de Artes Visuais da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. O texto foi produzido como trabalho da disciplina Fundamentos da Linguagem Visual, ministrada pelo professor Rafael Maldonado.